sexta-feira, 29 de junho de 2012

O CURSO DE CAMBINE - FOTOPOSTAGEM - 1ª PARTE

O Curso em Cambine é uma realização de parcerias muito especiais: Brasil - EUA - Moçambique (assim como Angola, no curso em Luanda). A Revda Olga é a coordenadora do projeto e o Rev. Julio Vilankulos o Diretor do Seminário Teológico de Cambine, onde aconteciam as devocionais diárias e as aulas. Abaixo uma sessão de fotos para sentir o clima do curso:
 Entrada do Seminário Teológico de Cambine: muitas expectativas
 Visão interna da capela: aqui vivemos muitos momentos de edificação espiritual, cantando, orando e ouvindo a Palavra
 Foto ampliada do Seminário, cercado por árvores
 O SD do Distrito de Inhambane, abrindo o Seminário de Capacitação
 De cima pra baixo: visão panorâmica da abertura do curso, da capela no primeiro dia efetivo de aula, e Blanches e eu na abertura
 As músicas fizeram parte integrante de todos os momentos
 Prof. Julio Vilankulos, na primeira meditação do curso
 O primeiro momento em sala, rostos novos, ainda desconhecidos

 A alegria de receber o material do SOLAFRICA. Ver os sorrisos era como uma injeção de ânimo para nós
 A revda Olga, SD e Diretora da Área de Educação. Abaixo: minha primeira aula em África
 Pra Marli, abençoando-nos para mais um dia de estudos
 A visão da capela é confortadora e profunda
 Nos intervalos, tempo de confraternização. Acima: Marli, Blanches, Nélia e Luiz. Abaixo: Teixeira, Salatiel, Amansio (atrás), eu e Bernardo

 Uma foto com todo grupo, que estava animado e interagindo muito bem. Abaixo, o importante momento do alimento, que merecerá um post especial
 A interação e interdisciplinariedade das áreas foi essencial para o sucesso do curso
 Outros participantes em momentos descontraídos: Boaventura, Damiao, Julio e Antonio (de bigode), o pastor-jornalista


 Os prédios que dominam esse ponto de Cambine: Acima, a Escola Secundária. Abaixo: A Igreja Metodista de Cambine e mais embaixo, visão exterior da Capela do Seminário. Todas as construções feitas com pedra do rio, ótimas do lado de fora, mas precisando de reformas internas

 Nos próximos dias, mais posts para alimentar a vossa percepção do decorrer do curso. Abraços de Mama África.

AS LÍNGUAS EM MOÇAMBIQUE 2 - Quadro das línguas presentes no país

Abaixo, segue um breve resumo das línguas e sua localização provincial, apenas para percebermos a complexidade linguística de Moçambique:
  • Maputo (capital): Ronga; Swazi; Zulu; Xangana - o Zulu também é falado na Africa do Sul, e isso se deve à proximidade das fronteiras.
  • Gaza: Xangana
  • Inhambane: Bitonga; Shope; Xitswa
  • Sofala e Manila: Xana; Cina; Nywngwi
  • Tete: Nywngwi; Singa; Nyanja
  • Zambézia: Shualia; Zamwé
  • Nampula: Makhuwa
  • Cabo Delgado: Makhuwa; Makondi; Kimwani
  • Niassa: Yão; Makhuwa
Resumo da fatura: 16 línguas (não são dialetos - essa designação foi imposta pelos dominadores, como meio de inferiorizar a cultura local), fora o português, que é a língua oficial, e o inglês, que muitos compreendem e falam, também pela proximidade com a África do Sul. Nem todas se compreendem, por isso o português ajuda a estabelecer uma unidade nacional.

Interessante é notar que, quando conversam entre si, os moçambicanos utilizam normalmente o português em questões de data, horário e numeral, talvez porque na própria língua essas convenções não sejam iguais e eles assimilaram aquela aprendida dos europeus.

AS LÍNGUAS EM MOÇAMBIQUE


Oficialmente Moçambique fala português (com sotaque similar ao de Portugal); essa unidade linguística foi imposta pelo conquistador séculos atrás. Dessa forma ele poderia definir regras e ensinar seu modo de vida, para facilitar o processo de dominação. Para os africanos, foi mais uma língua para aprender. Aqui convivem diversas línguas: apenas para exemplificar, dependendo da província (o estado moçambicano) há uma língua local predominante. O xitswa, que estou aprendendo, é a língua predominante na Igreja Metodista e na região de Inhambane, mas não é a única, pelo contrário, são dezenas de línguas que convivem e predominam de região em região (veja o post com o quadro das línguas de Moçambique).

O que acontece na verdade, então, é que as pessoas se comunicam no cotidiano em sua língua local; o português é o idioma de unidade nacional (o presidente fez o discurso da Independência em português), não porque não se entendam em suas línguas, mas para que não haja um sentido de dominação de um grupo sobre os demais. Pelo menos é a percepção que tenho; com o fim da dominação portuguesa, eles bem poderiam ter banido essa língua daqui, mas não o fizeram. De fato, manter o país com a fala lusófona é importante do ponto de vista das relações internacionais, haja visto a parceria SOLAFRICA, que só é possivel graças ao idioma comum.

No entanto, e para confirmar o que afirmei sobre o cotidiano, o que se percebe em Moçambique é que a língua portuguesa não é falada de maneira natural, como parte da cultura. De fato, fala-se um português estrangeirado, e algumas pessoas têm um sotaque tão forte que não entendemos o que dizem. Da mesma forma, de nossa parte, se falarmos o português "brasileiro" também não seremos entendidos. Precisamos falar pausadamente, utilizar o particípio mais que o gerúndio (estou a falar, em vez de estou falando), não usar gírias e nem termos muito complexos, a não ser que os expliquemos.

Para um estudioso do Novo Testamento, isso me fez perceber como deve ter se dado o uso da língua grega na Galileia, por exemplo (mas tambem em outras regiões dominadas cujo o idioma local não tivesse relação com o grego): falava-se um grego limitado, apenas para tratar de comércio e com estrangeiros, mas no cotidiano era o aramaico a língua utilizada. Desse modo, é possível entender também que uma "helenização" da Galileia deve ter sido muito limitada, especialmente forte nas cidades helenísticas e romanas que foram fundadas pelos dominadores, e muito fraca nas áreas rurais e aldeias circunvizinhas, como acontece aqui.

Essa análise - simplista e leiga, na verdade - de uma antropologia linguística em Moçambique nos mostra como funcionam sistemas similares de dominação estrangeira sobre um povo que não viveu o processo de miscigenação e sincretismo cultural. Mais uma vez o Brasil é um caso a parte, e por isso a vivência em terras estrangeiras é tão rica, quando estamos abertos a perceber as diferenças e as respeitamos.

CELEBRANDO A INDEPENDÊNCIA



Por uma dessas felizes situações que a providência divina nos proporciona, nossa estadia em Moçambique coincidiu com o Dia da Independência do País, celebrado no dia 25 de junho, desde que as forças revolucionárias da FRELIMO deram ao povo africano seu legítimo poder. Na verdade, os portugueses não chegaram a resistir no processo; receberam um ultimato e deixaram o país em 24h. A guerra de Moçambique foi de forças internas pelo controle do país, das quais a Frelimo foi a que se sobressaiu.

Não tenho como avaliar os avanços políticos que o país viveu desde então, mas pelo testemunho da Blanches, que esteve aqui em 2006 e pelo que pude observar pessoalmente, há sem dúvidas muita coisa pra comemorar. Estradas asfaltadas, permitindo circulação de pessoas e bens com maior velocidade, aeroporto modernizado (mesmo que com capital chinês), fornecimento de energia praticamente sem interrupção, e acima de tudo, um clima de paz, onde crianças e idosos podem fazer as coisas próprias de sua idade, sem medo da violência pela guerra, e com liberdade.

As pessoas aqui são alegres, característica comum aos brasileiros, mas sabe-se que o povo moçambicano, a exemplo de outros povos da África, tem o espírito aguerrido, e se for necessário, vai à guerra, nem sempre por motivos justos (se é que a guerra pode ter motivo justo, a não ser, excepcionalmente, quando é para libertar-se do jugo opressor de outro grupo).

Blanches e eu fomos celebrar esse dia na praia, pois as aulas foram devidamente interrompidas. Pretendia me banhar nas águas do Índico, e aproveitar para comprar souvernirs moçambicanos em alguma feira, se abrirem, lógico. Quanto ao primeiro objetivo, as fotos dão conta de que apenas molhei as pernas. Ironicamente, o tempo estava nublado, um vento frio e as águas geladas não me convidaram ao mergulho; fiquei com receio de ter dor de ouvido. Mesmo assim, senti o Oceano Índico aos meus pés. Quem sabe numa próxima vez eu mergulhe e até adentre no mar de barco, como se faz no Brasil, para mergulhos de snorkel.


Uma curiosidade a respeito desse dia é a importância dele para as famílias moçambicanas, posto que é o dia de comer carne. Isso mesmo: comer carne em Moçambique não é coisa do cotidiano, mas de ocasiões especiais. Não se pode nem mesmo falar em um dia semanal; é extraordinário mesmo. Exceção honrosa estamos tendo no curso: todos os dias há algum tipo de carne, o que demonstra a importância e deferência com que estamos sendo tratados. Não à toa, os alunos e alunas estão adorando esse período também por isso, claro.

Depois fomos almoçar num restaurante - vazio àquela altura - e comemos carne, claro, ouvindo o discurso do presidente pela televisão, nas festividades da Independência, e com o privilégio de apreciar um coral composto de funcionários do local, dirigidos pelo proprietário, um sul africano casado com uma moçambicana.



Ao fim do dia, passamos no orfanato de Cambine, administrado pela Igreja Metodista em parceria com a Igreja da Alemanha, onde joguei futebol com os meninos de lá.


Com isso, estamos vivendo o cotidiano desse belo país, o que nos permite interagir bastante com a cultura e os costumes. Nzi Bongile (muito obrigado), Moçambique.


quinta-feira, 21 de junho de 2012

VIAGEM PARA CAMBINE

As fotos abaixo mostram nossa viagem de Maputo a Cambine. Percorremos 500 km, rumo ao Norte, numa estrada litorânea, passando por cidades e vilarejos. Encontrei com a prof. Blanches na noite anterior, e saímos de madrugada, para essa jornada cultural.
 Saída de Maputo às 5h da manhã. No centro a sempre atenciosa Rosa
 No volante nosso querido Adolfo, e ao lado, um dos alunos do curso, Bernardo.
 O nascer do sol no caminho de Cambine. Sempre uma visão estimulante para iniciar uma jornada
 No caminho passamos por vários mercados de beira de estrada, em grande parte nas cidades. A maioria ainda nem estava funcionando.
 Uma choça, uma típica construção de palha, que hoje é considerada o nível mais baixo de pobreza como lugar de moradia.
 No caminho algumas surpresas, como uma loja da rede FKC. Na verdade Moçambique também recebe turismo, por causa das praias.
 Por falar em praia, demos uma pequena parada para olhar o Índico, num dia bastante ensolarado.
 Um bom trecho da estrada é dominada por coqueiros, abundantes da região. Me fez lembrar muito a mata do Nordeste.
 Uma feira em funcionamento, já próximos a Cambine, na cidade de Maxixe.
 As feiras e mercados pelos quais passamos são bastante rústicos, e nisso há uma diferença com o que temos em nossa terra.
 O caminho pra Cambine, agora sem asfalto. Areia fofa, o que indica proximidade de praia.
Finalmente em Cambine, já na entrada do Seminário Teológico daqui.
Em breve outra sessão, mostrando mais de Cambine e principalmente das pessoas daqui.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

CHEGADA EM ANGOLA

Luciano e Helmut chegaram bem em Angola. Depois de um vôo de 15 horas, com atraso em Johannesburgo, fomos recebidos por Pedro André Filipe, assessor episcopal para relações públicas da conferência oeste da IMU e o superintendente distrital revdo. Almeida Lemba. Ele já participou no programa Sol-África como visitante no Brasil. Ficamos para duas noite no Hotel Residencial Capital próximo a igreja.
 Da esq. para dir: Rev. Almeida Lemba, Rev. Pedro André Filipe e Prof. Luciano Lima.

PRIMEIRAS IMPRESSÕES


Chegar a Cambine foi uma experiência renovadora. Cambine é um vilarejo, que não é muito diferente de uma pequena cidade rural brasileira. As pessoas são acolhedoras, convive-se com os animais de maneira tranquila, não há movimento de veículos, o chão é de terra batida ou fofa, dependendo da área. Cambine tem um complexo de edifícios ligados à Igreja Metodista: um orfanato, o seminário, casa de hóspedes, casa pastoral, centro de convivência, que estão do lado de uma escola, e circundados por várias casas de alvenaria simples para nós, boas casas para os locais. Uma casa simples é na verdade uma choça, que estaria na base social daqui, como um barraco na favela está no Brasil.

As pessoas têm sido fenomenais na forma de nos tratar. A prof.ª Blanches já era conhecida de muitos, por isso a receberam como uma amiga, mas mesmo eu, que estou aqui pela primeira vez, tenho sido muito bem tratado, com carinho e já fiz vários amigos, como o Bernardo, o Teixeira, o Armindo e o Amansio, jovens pastores que enfrentam o desafio do ministério pastoral em comunidades de 800 a 1000 pessoas.

Estou hospedado na casa de missionários alemães, que chegam na quarta-feira, e não posso reclamar: tenho cama macia, tela nas janelas e portas, e se não tem banho quente, tenho fogo para esquentar a água e tomar banho de caneca (coisa que já fiz  muito na minha vida). A prof.ª Blanches está em outra casa, com a pra. Maísa, missionária brasileira aqui em Cambine.

Um problema que aprendemos a conviver aqui não é a falta de luz, mas de água após 19h, pois o abastecimento é cortado, por motivos que ainda não me são muito claros. Então tomamos banho até a hora do jantar, ou então só no dia seguinte.

Falando em jantar, a comida tem sido muito boa, nada tão diferente que eu possa chamar de exótica: frango, arroz, salada de repolho, alface e tomate, peixe frito inteiro com molho, e o famoso xime, um tipo de angu, que é branco porque o milho é branco. Disseram que eu ia emagrecer aqui, mas corre o risco é de engordar. Só o café é que não tem, aqui se toma muito chá. No café da manhã (chamado aqui de pequeno almoço ou mata-bicho) come-se ...

As frutas aqui são as mesmas tantas que comemos no Brasil: banana, tangerina (trangerin) foram as que vi. E tem o côco, muito comum na região, mas que ainda não vi.

E assim vamos convivendo com essa gente que tem a liberdade como princípio de vida, enfrenta muitas dificuldades, mas que é alegre e musical. Sobre isso falarei num próximo post.

APRENDENDO GISWA


Estar em um país diferente, onde se fala outro idioma, me desafia a aprender a falar na língua local. Moçambique me desafiou desse jeito, pois apesar da língua oficial ser o português, as pessoas falam mesmo é a língua de sua etnia ou grupo tribal. E não gostam que chamem de dialeto, pois essa foi a forma dos colonizadores menosprezarem as línguas faladas por esses povos antes da dominação europeia.

Pois bem, ouvir as pessoas conversando em giswa ou outra língua local me deixa agitado; quero aprender, nem que sejam expressões. Já aprendi diversas, mas com um problema fundamental: minha memória auditiva é fraca (talvez por não ser de uma cultura propriamente oral), por isso tenho que anotar em meu caderno as expressões que aprendo. Cantar também é uma boa forma de fixar as expressões, na verdade um dos meios mais antigos pelo qual a tradição oral tornou possível passar aprendizado entre as gerações.

Seja como for, esse é um dos aspectos que mais me fascina aqui, e vejo como eles gostam de ver meu esforço em aprender. Isso nos aproxima e gera um clima de confiança, que é tão importante nesses casos. A pra. Maísa, que tem se mostrado nossa principal articuladora de logística, me presenteou com uma Bíblia em giswa. Claro que fiquei muito agradecido e emocionado e vou usar nas aulas.

Agora vou ficar por aqui, porque nzi nani wurongo (estou com sono).  

gi Pelile (boa noite)


domingo, 17 de junho de 2012

CHEGADA EM MOÇAMBIQUE

Meu primeiro dia em Moçambique teve todos os ingredientes que eu curto num caso desse: estava sozinho, contando com a boa acolhida das pessoas, tendo o "estranhamento" e o fascínio pelo diferente  como parceiros íntimos. Abaixo uma série de fotos que marcaram esse dia:

A estranheza de andar do lado esquerdo do carro, na mão inglesa.
Adolfo, primeiro amigo a me receber, com quem tenho conversado muito sobre as culturas.

Igreja Metodista em Bangala, Maputo
Culto da manhã, cerca de 800 pessoas presentes
Celebração pelo Dia da Criança Africana. A criançada fez tudo, num culto maravilhoso.
O coral de crianças arrepiava, e os adultos deliravam
Irmão Titos, que me ajudou na tradução das partes do culto falado em xitsua, o dialeto do grupo predominante na Igreja Metodista de Moçambique

A liderança da Igreja, após o culto. Da esq. para a dir.: Pra Aida, eu, Pr. João Damião, sua esposa Filimina e o filho do casal no colo.