quinta-feira, 31 de maio de 2012

HISTÓRIA DE MOÇAMBIQUE



Esse material é uma reprodução do texto que se encontra no site das Nações Unidas, e sintetiza em poucas linhas uma longa história de luta e busca de liberdade. Chama a atenção que a região foi islamizada muito antes dos portugueses chegarem, e hoje os muçulmanos têm uma política de retomar o território. Como dizem por aí, a luta continua...

Breve História de Moçambique

Os primeiros habitantes de Moçambique eram caçadores e colectores, ancestrais de povos Khoisani. Entre o primeiro e quarto século DC, povos falantes da lingua Bantu migraram do norte através do vale do Rio Zambeze passando gradualmente para os planaltos e as áreas costeiras. Os Bantu eram agricultores e ferreiros.

Os Portugueses chegaram à costa oriental de Africa no início do século 16, desalojando governantes Arabes de muitas das vilas. Eles estabeleceram feitorias ao longo da faixa costeira. Após tentativas falhadas para penetrar no interior (particularmente para controlar as minas de ouro e prata no que é hoje o Zimbabwe), eles fizeram um esforço concertado para conquistar o interior nos finais do século 19. Em 1914 os Portugueses conseguiram a "ocupação efectiva" requerida pelas autoridades Europeias em 1885 na Conferência de Berlim para justificar os direitos de império.


Uma foto histórica do início do século XX com aldeões do interior do país

Em contraste com as políticas das outras autoridades coloniais em Africa depois de 1945, a ditadura de Salazar em Portugal (1932-1968) estava determinada a continuar nas colónias do País. A Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) formada em 1962, dirigiu a luta pela independência. Seguido ao golpe militar em Portugal em 1974, foi estabelecido um Governo de Transição Portugueses/Frelimo, e em 1975 o País tornou-se independente tendo a Frelimo assumido o poder, e seu lider, Samora Machel, tornou-se o primeiro presidente.

Inicialmente, a Frelimo seguia as políticas Marxista-Leninista, e foi violentamente combatida pela Resistência Nacional de Moçambique (Renamo), movimento formado em 1976/7 sob a direcção Rodesiana. Quando o regime minoritário da Rodésia foi retirado do poder, a Renamo passou a ser apoiada pela África do Sul, como parte da estratégia para aniquilar as políticas e economias de governos negros "estados da linha da frente" nas suas fronteiras.


Foto do movimento de Protesto da Frente de Libertação de Moçambique

O cansaço da Guerra e mudanças políticas na Africa do Sul e Moçambique – incluindo a mudança da Frelimo da doutrina Marxista-Leninista – ajudou a trazer o acordo de paz, assinado em Roma entre a Frelimo e a Renamo em 1992. O fim da Guerra civil, facilitada pelos Moçambicanos e pela comunidade internacional, é considerada como um dos maiores exemplos de sucesso de resolução de conflito em África.

Fonte: http://www.mz.one.un.org/por/Mocambique/Historia-de-Mocambique

domingo, 27 de maio de 2012

DIÁLOGO COM A BISPA JOAQUINA NHANALA


Sentados com aquela mulher tão expressiva, após 3 horas de reunião, a sensação era que poderíamos ficar mais um tanto ali, ouvindo-a. Voz tranquila, expressão serena, e profunda sabedoria nas palavras, assim é a Bispa Joaquina Nhanala, de Moçambique. Poderia aqui discorrer sobre a importância de tê-la nesse espaço num país onde o papel do masculino é preponderante, refletindo a Semana Wesleyana que está acontecendo nesse momento. Mas vou tratar disso em outro post, prometo.

Esse encontro teve como objetivo levantar questões, a respeito da expectativa dos moçambicanos sobre nossa visita, bem como conhecer aspectos que nos esperam, especialmente em termos culturais. Foi uma conversa informal, mas muito instrutiva, leve e agradável, que nos fez pensar muitas coisas. Abaixo vou inserir alguns aspectos conversados, que anotei em tópicos.

Importante saber que são ideias fragmentárias, não um retrato da cultura e do povo de Moçambique. Aliás, acho que o mais difícil num processo desses é despir-se de pré-conceitos, visões estereotipadas e certa postura arrogante, de achar que nossa cultura e país é mais avançado que a deles. Mas faz parte desse encontro repensar nossas convicções e compreensões.

Vejam então alguns temas que Bispa Nhanala nos ensinou sobre o povo moçambicano e a cultura africana:

  • Expectativa sobre a nossa visita: que quem aprenda possa ensinar depois (que é o objetivo deste projeto, desde que foi criado). Nós somos mufundises. Na África, Pastor é chamado mufundise (terminação indica um dialeto específico) que significa também professor. Isso é maravilhoso, porque confirma a vocação docente do ministério pastoral.
  • Sobre a língua portuguesa: as línguas na África são múltiplas, e as palavras variáveis, por isso o idioma português acaba sendo um aglutinador de diferentes culturas. Segundo a Bispa Nhanala, esse é um dado positivo da colonização: "Mas que bom que fomos colonizados em português, poderemos nos comunicar". Me fez pensar que um processo histórico negativo pôde deixar traços positivos entre povos tão diferentes. Reflexo de processos antigos, como o que deu origem aos textos do Novo Testamento em grego.
  • Método educativo mais adequado para o programa: público misturado (pessoas com preparo diferente – EUA, Africa University e Moçambique). Divisão em grupos e liderança da parte deles pode existir, é bom, mas se espera que mostremos o máximo.
  • Solteiros e não solteiros – um grande problema cultural. Há um bloqueio para  casados aceitarem o conselho dos solteiros. Casados são considerados mais importantes e socialmente mais maduros.
  • Divisão geográfica da Igreja: há três regiões em Moçambique: norte, sul e África do Sul. A etnia predominante na Igreja Metodista: xitsua. Historicamente, os portugueses tentaram suprimir as culturas locais, porque nunca pensou em sair da África. Quando se tornou independente, o governo trabalhou contra o tribalismo. Várias etnias, dialetos e idiomas locais.
  • Islamismo: relações amistosas com a Liga Muçulmana de Moçambique (tendência do Islamismo de arrebanhar um maior número de adeptos– investimento milionário para construção sistemática de mesquitas, em várias cidades e bairros, inclusive o interior) – trabalho conjunto para tratar de questões comunitárias e públicas, como malária, etc. Um exemplo para a questão ecumênica e do diálogo interreligioso.
  • Problema do adultério: homens que são casados e mantem namoradas fora do casamento: poligamia não oficial. Polígamos que se convertem podem manter suas esposas. Mas a Igreja oficialmente só admite a monogamia. Polígamos não podem ser pastores. Em Moçambique seminaristas são jovens, e por isso a maioria dos pastores são jovens (menos de 50 anos).
  • Ancestralidade: os anciãos são a cabeça representa a autoridade. Nas cerimônias de acolhida a cabeça do animal que foi servido vem cozida e é apresentada à maior autoridade presente, mas não precisa comer, basta provar. Curiosamente a bispa Nhanala foi uma das raras mulheres a provar uma cabeça numa cerimônia para homens. A cultura da ancestralidade é muito forte – na África, quando se crê em alguma coisa é muito difícil mudar. Por isso têm dificuldade em pensar sobre homossexualidade, são conservadores.
  • Religiosidade popular: em momentos de crise, o povo corre pra religião tradicional. Por ex: pedir algo aos antepassados. Ali, não se separa o secular e o sagrado, o sagrado influencia o secular. Quando a doença ou coisas parecidas acontecem, as pessoas buscam nos antepassados a força, bem nas divindades. Para a Igreja isso é visto de forma negativa. Mas, a tradição semita permite ver aspectos positivos nisso: senão como fica o conceito do Deus de Abraão, Isaac e Jacó (que o autor de Hebreus afirma que estão vivos!)?
  • Ordenação feminina: o ministério feminino tem 30 anos. As mulheres tiveram importante papel na luta de independência de Moçambique; podiam participar do dia a dia sem problema e ao mesmo tempo treinar nos campos para a luta. Por isso o governo de independência deu valor à mulher, e tem funções de poder na sociedade, o que influenciou a Igreja. Há muitos problemas de violência contra a mulher (doméstica principalmente), por isso há uma necessidade (um dos temas que iremos tratar é paz para os que estão perto = trabalhar saúde como não violência).
Foto oficial da reunião. Da Esquerda pra Direita: Demétrio, Luciano, a Bispa Nhanala, Blanches, Helmut e eu.

Estes aspectos são parte do quadro que vamos conhecer mais de perto, ou pelo menos conviver. O desafio de não ser arrogante e ao mesmo tempo poder passar um pouco do conhecimento é um dos principais, junto com o cuidado pra não pegar malária. Quanto clima, que vai estar ameno, o assunto foi responsável por um dos momentos cômicos. Diz a Bispa: "é bom levar uma camisola". Não entendemos muito bem, olhamos pra Blanches, até que alguém quebrou o silêncio: "mas o que é camisola?", perguntamos. "É o agasalho", disse a Bispa. Em Moçambique, blusa é camisola. E vamos que vamos...

quinta-feira, 24 de maio de 2012

FASE 1 - PREPARAÇÃO


Para quem pensa que os países da África são desorganizados e fáceis de chegar terá uma surpresa. Obter visto para Angola e Moçambique não foi simples, nem fácil. Surpreendente, considerando que são países de fala oficial portuguesa, mas o campo da diplomacia guarda mistérios que os mortais não desvendam facilmente. Assim, muito antes da viagem, há seis meses, começamos a preparação, preenchendo formulários, e cumprindo etapas de um ritual diplomático por vezes irritante.

Mas como dizem, quem está na chuva é para se molhar, então cá estamos nós com essa experiência: de um lado a parte burocrática, fichas e fichas para preencher, formulários bem detalhados, e documentos comprobatórios. E os formulários assinados precisam de reconhecimento em cartório, procedimento que diríamos ser bastante rigoroso.

Do outro lado a preparação tem a ver com prevenção da saúde; estivemos todos com o Dr. Jessé, do Hospital Dr. Emilio Ribas, no centro de São Paulo, onde tivemos muitas orientações sobre prevenção a diversos males, mas em especial, contra a malária, que não tem vacina, só profilaxia. Assim, ficou esclarecido que iremos usar roupas predominantemente claras (para a tristeza do Luciano), muito repelente (nada desses comésticos de farmácia) e tomar um antibiótico preventivamente (para minimizar os efeitos da malária, caso venhamos a contrair).

Além disso, tivemos a deliciosa experiência da vacinação. Eu mesmo, que estava desatualizado, tomei, até hoje, cinco vacinas, sendo que a antirrábica em três doses. Além dela, a de febre amarela, antitetânica, tríplice viral, e da gripe. Faltam a de hepatite e febre tifóide. Antes que você diga "quem mandou ir pra lá", saiba que se você for ao Norte do Brasil precisa das mesmas vacinas, e algumas delas servem para os centros urbanos do sudeste também. Vacina é, acima de tudo, prevenção para ter qualidade de vida. E nós não sentimos nada, pessoalmente não tive nenhuma reação (acho que os anticorpos tiveram tanto trabalho que esqueceram de acionar o botão da febre). Então valeu demais.

Abaixo, fotos da nossa equipe no hospital Dr. Ribas, com nosso companheiro de logística, Demétrio (ou Dimitriu, como gostamos de chama-lo também). Falta aqui o alemão mais brasileiro de todos, Helmut.



De cima pra baixo: eu, tomando a última dose da atirrábica, a Blanches sorrindo na sua vez, e o Demétrio (esq.) feliz ao lado de um desconfiado Luciano, que já tinha tomado sua dose.